quinta-feira, 21 de junho de 2018

NOEL GUARANY – O GUITARREIRO DAS MISSÕES

Foto site "Portal das Missões"


Noel Borges do Canto Fabrício da Silva (Noel Guarany), o inigualável cantor- poeta dos pagos missioneiros, nasceu no dia 26 de dezembro de 1941, em Bossoroca-RS, na época Distrito de São Luiz Gonzaga e foi criado em Garruchos e São Luiz Gonzaga, sendo filho de João Maria Fabrício da Silva e Antoninha Borges do Canto. 
Toda sua vida foi dedicada à música sul-rio-grandense, na pesquisa do folclore, do ritmo e do verso genuinamente missioneiro. Segundo ele, seu trabalho tinha como finalidade “divulgar o folclore campesino sul-americano”. 
Como descendente de índios guaranis, Noel recebeu destes os primeiros conhecimentos da cultura nativa. Autodidata, procurou aprender sozinho o idioma guarani; tocar, compor e cantar. Aos quinze anos, tocava acordeon e aos dezesseis, adotou como eterno companheiro o violão. 
A partir de 1960, passou a percorrer a América Latina com o esplendor da sua voz e o som límpido e inigualável de seu violão, tornando-se o responsável pelo registro do folclore da região das Missões e Alto Uruguai e pela sua divulgação no Brasil e no exterior. 
Seu trabalho não é mera inspiração poética. É resultado de incessante pesquisa obtida através de entrevistas de índios e velhos violinistas, onde coletou material sonoro para o ritmo inconfundível de suas milongas, chamarritas e canções campeiras populares. 
Iniciou sua carreira tocando em bailes e na rádio São Luiz, de São Luiz Gonzaga. Fez uma imensa trajetória pela América do Sul, onde conheceu intelectuais, folcloristas, peões de estância e descendentes dos Guaranis, começando uma busca de integração da cultura dos povos sul-americanos. Em 1962, fazia a divulgação de zambas argentinas e chilenas. Em 1968, era responsável por um programa na rádio Cerro Azul, de Cerro Largo. Mais tarde, Noel Guarany passou a fazer um programa na rádio Guaíba e, após, na rádio Gaúcha.
Participou de diversos festivais e arrancou aplausos do público mais simples ao mais exigente em espetáculos folcloristas. Realizou conferências, apresentou-se para universitários e filosofou para intelectuais. O Palácio Piratini teve, durante um ano, a presença de Noel Guarany em apresentações artístico-culturais. 
Seu trabalho foi, passo a passo, sendo reconhecido, chegando a ter duas músicas suas sendo preparadas para ter gravação de Elis Regina. Entre os compositores e músicos que admirava estão Aureliano de Figueiredo Pinto, Jayme Caetano Braum, Cenair Maicá, José João Sampaio e Pedro Ortaça. 
Noel Guarany, o payador missioneiro, nunca disse meias verdades. Foi do canto lírico ao canto de denúncia social. Desentendeu-se com gravadores e com a Ordem dos Músicos, polemizou faltosos valores e conceitos, criticou o tradicionalismo que não representava a verdade sobre nossos costumes, nossa história e nossa gente. Segundo ele, um  tradicionalismo e uma produção cultural para vender: “Quando voltei ao Brasil, comecei a sentir o cheiro de podridão na arte do Rio Grande do Sul, ao ver cantores suburbanos vestindo longas e espalhafatosas indumentárias de souvenirs para iludir turistas trouxas”. 
A postura irreverente e combativa fez com que recebesse o título de “Payador Maldito”.
Acometido, há alguns anos, de ataxia cerebral degenerativa, doença que lhe tirou a coordenação motora e memória, Noel Guarany falece em 06 de outubro de 1998 em Santa Maria, deixando a esposa Neide da Silva Machado e as filhas Lia, Linda Laura e Andréa.  O “cantor da Bossoroca” está sepultado  em sua terra natal, onde foi construído um memorial em sua homenagem. 
Noel Guarany, que teve como música mais popular, justamente sua primeira melodia gravada “Romance do Pala Velho”, deixa um legado com uma vasta produção artística registrada em um total de 12 discos, incluindo participações. 1
Em novembro de 2015, a Confraria do Icamaquã inaugurou, em Bossoroca, uma estátua em homenagem ao filho ilustre do município, conhecido como um dos “Quatro Troncos Missioneiros”. 2
Noel Guarany esteve em Bagé na década de 1970, onde tinha vários amigos, entre eles Eron Vaz Mattos, Gaspar Pereira Silveira, Joanes Brites Rodrigues e José Álvaro Corrêa dos Santos. Durante o tempo em que esteve na Rainha da Fronteira, participou da Semana Crioula de Bagé e compôs a música “Na baixada do Manduca”, onde referenciou regiões e personagens locais: “Jaguarão Chico e Vichadero, se alvorotou a peonada, do caseiro ao capataz todos de bota ensebada, e o careca Saragoza nem liga pras gineteadas. A prendinha Ana Luísa filha do nosso patrão, já encardou água de cheiro vindo de outro rincão e um delantal colorado partido de sua opinião”. 3
 A canção fez parte do LP “Payador, Pampa e Guitarra”, feito em parceria com Jayme Caetano Braun e gravado 1976, na Argentina, disco totalmente patrocinado pelo Centro Nativista Gaspar Silveira Martins. 4
Nessa época, Noel estava no auge de sua carreira e prenunciou para Eron Vaz Mattos que, seu trabalho somente ia receber o reconhecimento dali a cinquenta anos. 
Na década de 2000 tive a oportunidade de conversar com a viúva de Noel, Neide da Silva Machado, que comentou que ele pressagiava que sua obra apenas seria valorizada dez anos após sua morte e, no ápice da enfermidade, já quase sem memória, a única coisa que recordava era: “eu gostava de ser cantor”... 

FONTES:

1Sosa, Chico Sosa. “Destino Missioneiro”, Santa Maria, Che Sapukay , 2003. 144 p. 
2http://portaldasmissoes.com.br/noticias/view/id/486/estatua-a-noel-guarany-inaugurada-em-bossoroca,-sa.html
3https://www.letras.mus.br/noel-guarany/849979/
4http://repositorio.ufpel.edu.br/bitstream/ri/2737/5/Payador,%20pampa%20e%20guitarra.pdf




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