domingo, 24 de junho de 2018

PEÃO POSTEIRO

Segundo o Dicionário Gaúcho, “posteiro” é o empregado de uma estância que, morando geralmente nos limites ou divisas dela, ajuda nos rodeios, cuida do gado e das cercas. Na década de 1990, meu pai arrendava uma propriedade próxima ao Corredor dos Farias, na divisa entre os municípios de Bagé e Candiota. Quase em frente a esta, existia um posto da Estância Santa Elaine, no qual trabalhava o senhor Paulo Caraballo Gomes e sua esposa, conhecida carinhosamente como dona “Chininha”. Além desse campo, o casal também cuidava dos demais potreiros e invernadas pertencentes à fazenda. Ajudava no trabalho um grupo de mais ou menos 15 cachorros de diversas raças, idades e sexos. Era lindo de vê-los no serviço, quando uma tropa estourava e se desviava da direção pretendida, seu Paulo ordenava: “faz a volta, faz a volta” e a cuscada repontava mais que ligeiro o rebanho, trazendo-o para o caminho correto. Também era bonito de ver quando uma rês se apartava da tropa e a cachorrada saía feito um enxame de abelha e trazia a rebelde abaixo do mau tempo, movida pelo comando: “traz de volta, traz de volta”. Já dizia meu velho pai: “um cachorro bem treinado vale mais do que três peões”. Além da cuscada, a esposa também ajudava na lida campeira. A pegada era cedo, antes de clarear o dia. Com os pingos encilhados, o casal saía para fazer a recolhida. Como passavam o dia inteiro no campo, levavam um pedaço de carne nos bastos para assar no almoço. Não adotavam o horário de verão, pois eram avessos a regras convencionais. Seu Paulo tinha uma dieta baseada basicamente em carne ovina ingeridas em praticamente todas as refeições. A primeira e a última eram servidas de madrugada e o alimento sempre era o mesmo: bife de ovelha. Nos churrascos, durante as confraternizações, seu Paulo não usava prato e nem talheres, somente sua faca campeira, com a qual cortava os assados diretamente nos espetos e me comentava: “eu gosto de carne gorda, seu Tasso”...E assim levava a vida, como os gaúchos primitivos, enforquilhado sobre o lombo do cavalo. Até que um dia sentiu uma forte dor no peito durante a madrugada. Procurando ajuda médica, tocou para Bagé, conduzindo seu auto estrada afora, pois a esposa não sabia dirigir. Mas, quando faltavam poucos quilômetros para chegar, infelizmente acabou falecendo, próximo à Embrapa. Incomunicável e desamparada, dona Chininha vai de a pé até a cidade em busca de socorro. E assim, se foi seu Paulo, meu amigo, “legenda do Rio Grande”, mas ficou bem vivo em minha lembrança, cada vez que escuto a música “Romance do Peão Posteiro”: “Quando volto às casas num final de tarde/venho assoviando uma coplita mansa/ meio basteriado pela dura lida/mas meu coração canta de esperança/sei que me esperam junto da janela/dois olhos matreiros presos à distância/é a dona do rancho que sai porta afora/para os braços rudes desse peão de estância. É um rancho posteiro num fundo de campo/ meu pequeno mundo que eu mesmo fiz/como por encanto torna-se um palácio/
para a prenda rainha que me faz feliz/essa prenda linda prendeu meu destino/não sou mais teatino, veja o que ela fez...”

FONTES: 

http://porteiras.s.unipampa.edu.br/pibid/files/2012/12/Let_pdp_gloss%C3%A1rio-Simoes-Lopes-Neto_Jo%C3%A3o-Severiano.pdf
https://www.letras.mus.br/os-mateadores/213909/

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