sábado, 2 de novembro de 2019

A PRÁTICA DA DEGOLA ATRAVÉS DOS TEMPOS


A origem da degola, que consiste em cortar com uma lâmina afiada a cabeça do indivíduo, por vezes decepando-a do corpo, perde-se no fundo imemorial das eras. É uma prática primitiva de vingança e de ódio, que se evidencia pela convicção da morte do condenado, esvaído no próprio sangue, morrendo quase instantaneamente. 
A Bíblia narra o episódio do jovem Davi, abatendo o gigante Golias com uma pedrada de funda, logo cortando-lhe a cabeça fora, pelos anos mil antes de Cristo (1 Samuel 17: 49-51).

A degola é fruto do ódio vingativo. Após a derrota de Leônidas no desfiladeiro das Termópilas, Xerxes, o vencedor, ao saber que ele era rei e general, ordenou que lhe cortassem a cabeça e a pregassem num poste. Essa atitude do general Persa, segundo o historiador Heródoto, era a prova do ódio que ele nutria contra Leônidas para “tratar seu cadáver com tanta desumanidade".
Na América do Sul, vamos encontrar o tirano Manoel Oribe, conhecido como o “Tigre de Palermo" e Manuel Rosas, chamado de "Corta Cabeças”, ambos com uma história de crueldade, encarnando a maldade implacável, perversa e feroz.
Após o Combate do Arroyo Grande, o “Corta Cabeças" mandou executar mil e quinhentos prisioneiros, entre eles, cinquenta oficiais. O General João Facundo Quiroga dominava pela violência e pelo terror. Seu exército carregava uma faixa colorada com o dístico aterrador: "Sangue, terror, barbárie".
No Brasil, notadamente no Rio Grande do Sul, esse hábito de matar cortando a garganta e tirando a cabeça fora, toma vulto a partir da Revolução de 1893, com um arremedo das revoluções platinas. Durante o movimento, a degola tornou-se uma constante prática de combate, pois era uma forma rápida e barata de execução.

O próprio Júlio de Castilhos, autoridade máxima do estado, teria de certa forma, incitado a prática, ao telegrafar a um dos seus chefes (Cel. Madruga de Cacimbinhas, atual Pinheiro Machado) a seguinte orientação: “Ao inimigo não se poupa, nem a vida, nem os bens.”
Durante a Revolução Federalista, a prática de degolar foi aprimorada com requinte de pavor. Apareceram quatro tipos bem diferenciados de cortar a cabeça do vencido. A primeira simplesmente seccionavam as carótidas, para verem a criatura se debater, alucinada, tentando segurar o próprio sangue. A segunda, chamava-se “degola crioula”: era a arte de passar um corte de orelha a orelha,
conhecida pelos gaúchos como “gravata colorada"; a terceira era a degola pela nuca ou científica, feita por um profundo corte no pescoço, fazendo a cabeça do trucidado tombar para a frente, levando o corpo ao chão, já sem vida. E a quarta era a daqueles que, não se satisfazendo em matar, cortando do adversário a garganta, decapitavam-no tirando a cabeça fora.

Existiram vários degolares durante a Revolução de 1893, sendo os mais famosos: “Xerengue” pelo lado governista (Pica-paus) e Adão Latorre pelos revolucionários (Maragatos).
Dos grandes episódios de ferocidade que assinala a Revolução Federalista, três merecem destaque:
o combate do Rio Negro (27.11.1893), a surpresa do Boi Preto (10.4.1894) e a batalha de Campo Osório (24.6.1895) onde pereceu o Almirante Saldanha da Gama.

A degola atingiu o auge na prática e intensidade na Revolução de 1893, mas não deixou de ser registrada, embora de forma mais branda, na Revolução de 1923, e o mais triste é que vitimou centenas ou milhares de criaturas inocentes e até sem nenhuma inclinação partidária.

Fontes:
Figueiredo, Osório Santana. “As Revoluções da República”, São Gabriel, Gráfica Pallotti, 1995.280 p.
Diversos autores. “Fontes para a História da Revolução de 1893 – Anais do III Simpósio realizado em Bagé, de 28 a 30 de abril de 1993”, Bagé, EDIURCAMP, 1994.184 p.
Revista da Brigada Militar, publicação comemorativa dos 175 anos da Corporação – Novembro de 2012. 78 p.

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