A origem da degola, que consiste em cortar com uma
lâmina afiada a cabeça do indivíduo, por vezes decepando-a do corpo, perde-se
no fundo imemorial das eras. É uma prática primitiva de vingança e de ódio, que
se evidencia pela convicção da morte do condenado, esvaído no próprio sangue,
morrendo quase instantaneamente.
A Bíblia narra o episódio do jovem Davi, abatendo o gigante Golias com uma
pedrada de funda, logo cortando-lhe a cabeça fora, pelos anos mil antes de
Cristo (1 Samuel 17: 49-51).
A degola é fruto do ódio vingativo. Após a derrota
de Leônidas no desfiladeiro das Termópilas, Xerxes, o vencedor, ao saber que
ele era rei e general, ordenou que lhe cortassem a cabeça e a pregassem num
poste. Essa atitude do general Persa, segundo o historiador Heródoto, era a
prova do ódio que ele nutria contra Leônidas para “tratar seu cadáver com tanta
desumanidade".
Na América do Sul, vamos encontrar o tirano Manoel
Oribe, conhecido como o “Tigre de Palermo" e Manuel Rosas, chamado de
"Corta Cabeças”, ambos com uma história de crueldade, encarnando a maldade
implacável, perversa e feroz.
Após o Combate do Arroyo Grande, o “Corta Cabeças" mandou executar mil e
quinhentos prisioneiros, entre eles, cinquenta oficiais. O General João Facundo
Quiroga dominava pela violência e pelo terror. Seu exército carregava uma faixa
colorada com o dístico aterrador: "Sangue, terror, barbárie".
No Brasil, notadamente no Rio Grande do Sul, esse hábito de matar cortando a
garganta e tirando a cabeça fora, toma vulto a partir da Revolução de 1893, com
um arremedo das revoluções platinas. Durante o movimento, a degola tornou-se
uma constante prática de combate, pois era uma forma rápida e barata de
execução.
O próprio Júlio de Castilhos, autoridade máxima do
estado, teria de certa forma, incitado a prática, ao telegrafar a um dos seus
chefes (Cel. Madruga de Cacimbinhas, atual Pinheiro Machado) a seguinte
orientação: “Ao inimigo não se poupa, nem a vida, nem os bens.”
Durante a Revolução Federalista, a prática de degolar foi aprimorada com
requinte de pavor. Apareceram quatro tipos bem diferenciados de cortar a cabeça
do vencido. A primeira simplesmente seccionavam as carótidas, para verem a
criatura se debater, alucinada, tentando segurar o próprio sangue. A segunda,
chamava-se “degola crioula”: era a arte de passar um corte de orelha a orelha,
conhecida pelos gaúchos como “gravata colorada"; a terceira era a degola
pela nuca ou científica, feita por um profundo corte no pescoço, fazendo a
cabeça do trucidado tombar para a frente, levando o corpo ao chão, já sem vida.
E a quarta era a daqueles que, não se satisfazendo em matar, cortando do
adversário a garganta, decapitavam-no tirando a cabeça fora.
Existiram vários degolares durante a Revolução de
1893, sendo os mais famosos: “Xerengue” pelo lado governista (Pica-paus) e Adão
Latorre pelos revolucionários (Maragatos).
Dos grandes episódios de ferocidade que assinala a
Revolução Federalista, três merecem destaque:
o combate do Rio Negro (27.11.1893), a surpresa do Boi Preto (10.4.1894) e a
batalha de Campo Osório (24.6.1895) onde pereceu o Almirante Saldanha da Gama.
A degola atingiu o auge na prática e intensidade
na Revolução de 1893, mas não deixou de ser registrada, embora de forma mais
branda, na Revolução de 1923, e o mais triste é que vitimou centenas ou
milhares de criaturas inocentes e até sem nenhuma inclinação partidária.
Fontes:
Figueiredo,
Osório Santana. “As Revoluções da República”, São Gabriel, Gráfica Pallotti,
1995.280 p.
Diversos
autores. “Fontes para a História da Revolução de 1893 – Anais do III Simpósio
realizado em Bagé, de 28 a 30 de abril de 1993”, Bagé, EDIURCAMP, 1994.184 p.
Revista
da Brigada Militar, publicação comemorativa dos 175 anos da Corporação –
Novembro de 2012. 78 p.
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