sábado, 2 de novembro de 2019

Teixeirinha & Mary Teresinha – De Bagé para o mundo


A imagem acima foi clicada pelo fotógrafo Antônio Candiota, quando Teixeirinha se apresentou no Cine Glória, em 4 de abril de 1963. Oportunidade em que o artista conheceu Mary Teresinha e iniciou a dupla

Mary Teresinha Cabral Brum, a “Mary Teresinha” nasceu em Tupanciretã no dia 30/03/1946. Filha de Euclides do Nascimento Brum e Wilma Cabral Brum.
Aos quatro anos, mudou-se com a família para Pelotas, onde residiu até 1960. Nessa época, já floreava as primeiras notas no acordeom. Posteriormente, veio a residir com a família em Bagé, onde estudou no IMBA (Instituto de Belas Artes).
Em abril de 1963, Teixeirinha chegara a Bagé para se apresentar no Cine Glória. Gravara "Coração de Luto" no ano anterior e estava “estourado” em todo o Brasil. Mary, com apenas 15 anos, era famosa em Bagé e região por tocar as canções do “rei do disco” na Rádio Cultura. O apelido, “Teixeirinha de saias”, não deixava dúvidas sobre o talento da menina.
Quando Teixeirinha estava para realizar seu segundo show na Rainha da Fronteira, uma multidão ensandecida aguardava o ídolo. Há pouco, ele saíra do anonimato para tornar-se o maior fenômeno de vendas da história da música gaúcha. A menina Mary Teresinha, decidida a assistir à apresentação do cantor, era mais uma das tantas pessoas que lotariam o Cine Glória naquela noite de quatro de abril de 1963. A diferença é que Mary se tornaria – em poucas horas – parte daquele show.
Antes do início da apresentação, ocorreria um concurso para premiar com um mil-réis, quem melhor tocasse as músicas de Teixeirinha no acordeom. Mary inscreveu-se na disputa, afinal, se vencesse poderia ajudar seus pais nas despesas daquele mês. Tocando “Briga no batizado”, a guria magrinha, de cabelos negros e compridos, conquistou o público e arrebatou o primeiro lugar. Depois do concurso, Dirceu Mendes, diretor da Rádio Cultura, chamou Mary e avisou que o gaiteiro de Teixeirinha (na época Ademar Silva) havia perdido o ônibus e não chegaria para a apresentação. Mary acompanharia Teixeirinha.
Em poucos minutos, Mary conheceu seu ídolo, fez um breve ensaio, subiu ao palco e levou os mil e seiscentos espectadores do show ao êxtase. Certamente, aquilo nunca acontecera nas apresentações de Teixeirinha. Um talento local ao lado do grande cantor! Dali pra frente, formava-se a dupla Teixeirinha & Mary Teresinha, talvez o mais famoso dueto da história do estado do Rio Grande do Sul.
Juntos, Teixeirinha e Mary gravaram mais de 70 LP’s e um número incontável de discos 78RPM. A dupla atuou ainda em 12 filmes, sempre nos papéis principais. Mary foi cigana, estudante, iemanjá… Mas sempre foi Mary Teresinha. Seu talento na gaita aumentou com o passar dos anos. Em pouco tempo, ela passou a ser responsável por grande parte da produção dos discos de Teixeirinha, preparando arranjos e auxiliando no aprimoramento das composições do astro.
A partir de meados da década de 1960, iniciaram-se as gravações dos primeiros desafios, que se tornariam uma febre no Rio Grande do Sul inteiro. Agora, era a voz de Mary que se revelava. As “trovas” (como ficaram conhecidas) traziam verdadeiras guerras entre o casal. Mas no fim, tudo acabava na reconciliação dos dois.
A relação entre Teixeirinha e Mary Teresinha acabou ultrapassando o campo profissional: eles mantiveram uma união também fora dos palcos. Esta união, que durou 22 anos, gerou dois filhos – Alexandre e Liane. Juntos, Teixeirinha e Mary percorreram os mais longínquos recantos das Américas, cantando, brincando e levando mais alegria a seus milhares de fãs.
Em 1983, a relação entre os dois passou por dificuldades, resultando no fim da dupla. Separaram-se tanto artística como afetivamente. Embora a imprensa tenha tratado o assunto com certo sensacionalismo, sabemos que os desentendimentos são comuns em qualquer situação. Sendo assim, não caberia fazermos qualquer juízo de valores sobre a separação.
O importante mesmo foi o legado que a dupla deixou em sua longa carreira. Depois da separação, ambos continuaram produzindo. Teixeirinha prosseguiu em carreira solo até falecer, em 1985. Mary, entretanto, percorreu alguns países, gravou novos gêneros e, no início dos anos 1990, converteu-se à doutrina evangélica. Em 1992, escreveu o livro “A gaita nua” – sua autobiografia. Como cantora gospel seguiu fazendo sua “safoninha chorar” pelo Rio Grande afora. Atualmente, ela ministra palestras em igrejas evangélicas, onde conta seu testemunho de conversão e canta os louvores de seus quatros discos: “Serva de Deus”, “Quando eu abro essa sanfona”, “Minha jornada” e “A serviço do Rei”.
Num balanço sobre as carreiras de Teixeirinha e Mary Teresinha, alguns poderiam se arriscar a dizer que ele não precisava da acordeonista para alcançar o sucesso – como, de fato, ocorreu no princípio. Contudo, parece certo que, sem aquela menina da gaita, a carreira de Teixeirinha teria deixado de ter um toque especial. Numa de suas últimas entrevistas à televisão, Mary declarou algo que parece sintetizar tudo o que aqui falamos: “Aquela dupla formou um quadro: ele [Teixeirinha] foi a pintura; eu [Mary Teresinha] fui a moldura!”.

Fontes:
Teresinha, Mary “A gaita nua – Autobiografia”, Porto Alegre, Rígel, 1992.128p.

O BEIJO DO FORTE DE SANTA TECLA


O beijo é uma demonstração de afeto e carinho mais antiga da face da terra. Tirando os de paixão e de amor, existem vários outros tipos de beijos.
Antigamente, costumava-se beijar as mãos dos mais velhos em sinal de respeito. Durante os namoros, beijar, só em pensamentos. Esse ato tão natural nos dias de hoje, só era permitido, após o sim no altar.
Algumas pessoas mais velhas costumavam (e costumam) beijar alguém mais novo do sexo oposto com tanto frenesi, que os deixavam ora babados, se fossem homens, ora marcados de batom, se fossem mulheres.
Também era comum, um homem beijar a mão da mulher, jovem ou não, em sinal de admiração e cavalheirismo.
Além disso, é hábito até os dias atuais, beijar com extremo carinho, os bebês e crianças pequenas. No entanto, alguns exageram na dose, ao ponto das crianças comentarem com seus pais ou responsáveis: “O tio (ou tia) tem beijo babado”. Alguns pequenos, não conseguem disfarçar o desconforto desse beijo “molhado” e o limpam na hora.
Sem dúvida o beijo mais famoso da história, foi o que Judas deu em Jesus, antes de entregá-lo as autoridades romanas, para ser condenado à morte.
Em Bagé também houve um inusitado beijo que marcou época, não referido até 2012, inclusive, pelos amantes da história da Rainha da Fronteira. O fato aconteceu durante o cerco ao Forte espanhol de Santa Tecla.  As tropas, luso-rio-grandenses comandadas por Rafael Pinto Bandeira chegaram à fortificação em 18/02/1776. As primeiras tratativas de entrega do reduto se deram ao final da primeira semana do cerco, entre o capelão português e o capelão espanhol.  
Em outro encontro, ocorrido em 10/03/1776, o próprio Bandeira e o capitão Luiz Ramires, comandante do forte, ficaram frente a frente, aí acontecendo o episódio mais constrangedor da vida das campanhas militares daquele homem sagaz. O próprio caudilho português conta: “Logo que nos topamos, o primeiro cortejo foi dos abraços, depois três beijos, dois nas faces e um nos beiços, cumprimento que a primeira vez que vejo”.
Para o pesquisador pinheirense Artêmio Vaz Coelho, Rafael Pinto Bandeira foi o primeiro gaúcho sul-rio-grandense, porque reunia todas as qualidades para isso, pois além de ter nascido aqui, também foi estancieiro, grande líder, exímio estrategista militar e valente guerreiro.
O constrangimento é patente se considerarmos que o beijo na boca passou também a representar uma espécie de contrato entre o senhor feudal e o seu vassalo. Era algo como “dou minha palavra”. Os burgueses adotaram o beijo na face como sinal de saudação; os nobres usavam o beijo na boca para o mesmo fim.
Interessante que para duas personagens da nossa história de ascendência ibérica, a aparente naturalidade de um, no caso o espanhol, e o embaraço do outro, no caso o português, causasse neste último tamanha reminiscência.
A favor da sua surpresa, o ato do capitão sitiado pode ter sido facilitado pela baixa estatura de Rafael, como sempre é retratado nas pinturas.
Com todos esses atributos, dá para imaginar o quanto fora embaraçoso para Rafael o beijo que levou de Ramires, diante dos seus comandados perfilados em pleno pampa gaúcho.

Fontes:

LOPES, Cássio Gomes (LUCAS, Edgard Lopes); "Cerros de Baye – Santa Tecla – Origens de Bagé", Bagé, LEB, 2012.
 MARTINEZ. João Flávio Martinez. “A História do Beijo e as Religiões”, Set/2011, http://www.cacp.org.br/a-historia-do-beijo-e-as-religioes/
MONTEIRO, Germano Campos; "O Beijo", Porto, Imprensa Civilização, 1921.




FERNANDO MACHADO



Fernando Machado de Sousa nasceu no dia 11 de janeiro de 1822, na cidade de Desterro, capital da Província de Santa Catarina. Filho do Capitão Manoel Machado de Sousa e Dona Josefa Bernardina de Sousa. Viveu a infância entre gente do Mar na Armação de Itapocoroi.
Estudou nessa capital de província em um colégio mantido pelos padres jesuítas, buscando os rudimentos de uma carreira útil a si e a sociedade.
Fernando Machado de Sousa foi um militar que só teve tempo para ser militar. E, como Luiz Alves de Lima e Silva (O Duque de Caxias), de quem foi comandado muitas vezes, nunca saiu da legalidade.
Com 16 anos incompletos, em 09 de novembro de 1838, sentou praça no Corpo Provisório de Desterro, como 1º Cadete. Não existe a equivalência com o que se chama hoje de Cadete, tanto assim que, depois no dia 1º de fevereiro de 1839, foi promovido à graduação de 2º Sargento. E subiu a escalada da carreira onde alcançou a culminância de herói militar, galgando degrau por degrau com aplicação, inteligência e sensibilidade: foi um militar mesmo e jamais um homem fardado.
O seu batismo de fogo foi contra os farroupilhas no combate de Imaruí, em Santa Catarina, em 09 de novembro de 1839. Era Sargento-ajudante e muito interessado na carreira militar. Quando em seguida participou na operação defensiva de São José do Norte, RS, atacado pelos farroupilhas de Bento Gonçalves, já era alferes e estava servindo no Batalhão da Serra. E no contingente militar comandado pelo Barão de Caxias, lutou em São Paulo e em Minas Gerais, nos focos inflamados pelo idealismo do Movimento Liberal de 1842.
No Rio Grande do Sul, tomou parte ainda contra os farroupilhas de David Canabarro nos combates de Ponche Verde (26/05/1943 - Dom Pedrito) e Porongos (14/11/1944 - Pinheiro Machado) e foi dos muitos oficiais da guarnição de Alegrete, onde comandou a tropa da legalidade o desassombrado Coronel Arruda.
Estava com 26 anos incompletos quando foi promovido ao posto de Capitão, em 02 de Dezembro de 1847. Permutou com outro capitão a transferência do Batalhão e seguiu para a guarnição militar do Rio de Janeiro. Todavia, de lá foi transferido para Minas Gerais, onde ficou até novembro de 1849.
No inicio da Guerra do Paraguai, estava no comando de um batalhão, com febre palustre, e baixou para tratamento. Retornou ao teatro de operações como tenente-coronel e foi comandar a 11ª Brigada de Infantaria, do 2º Corpo do Exército, em Curuzu.
Observando-se todas as manifestações da sua bravura, a partir de Curuzu, tem-se o roteiro do heroísmo que o levou a entrar para a história.
Curuzu, Passo da Pátria, Tuiuti (nesta foi ferido com gravidade, porém afastou-se apenas o necessário para os curativos); prosseguiu o roteiro: Potreiro Pires (lá uma bala fura-lhe o boné e raspa-lhe o couro cabeludo); continua e participa destacadamente, na operação da Linha Sauce; depois vem Curupaiti e Humaitá. E avançando como lhe competia avançar, chega comandando a 5ª Brigada de Infantaria às margens do rio Itororó; e comandando os batalhões de voluntários, avançando a exemplificar como Chefe, cai ferido, agora mortalmente, já depois de ter atravessado a ponte, em seis de dezembro de 1868, aos 46 anos.
O Coronel Fernando Machado de Sousa possuía as seguintes condecorações: Medalha da Campanha do Uruguai: as dignidades; Cavalheiro de São Bento de Aviz, Cavalheiro da Rosa e Hábito do Cruzeiro.
Pela sua bravura e heroísmo em defesa da pátria, foi homenageado com nome de rua na Capital Gaúcha e em Bagé; e também nas cidades catarinenses de Chapecó e Lages. Além disso, seu nome denomina o 63º Batalhão de Infantaria de Florianópolis, em Santa Catarina, do qual é patrono desde 1986.

Fontes:
DONATO, Ernani. “Dicionário de Batalhas Brasileiras”, São Paulo: IBRASA, 1996. 596p.
Jornal Minuano, Coluna especial "Conheça sua cidade" 1999.




DR. BRÁS MACHADO


Brás Coronel Machado nasceu em Bagé no dia 12 de julho 1926. Filho de Valdemar Amoretty Machado e Genny Coronel Machado.
Fez seus primeiros estudos com a professora D. Leopoldina, que lecionava na Escola Melanie Granier. Frequentou primeiramente a Escola São Luiz Gonzaga, do professor Pery Coronel Machado, seu tio, onde cursou o antigo científico. Após, concluiu o ginásio no Colégio Nossa Senhora Auxiliadora.
Depois, foi para Porto Alegre onde se formou em Medicina pela Universidade do Rio Grande do Sul (URGS), pós-graduando-se posterirormente no Hospital de Clínicas de São Paulo. Especializando-se na área de ginecologia e obstetrícia, inicialmente atuando em Novo Hamburgo; posteriormente, em Bagé a partir de 1955.
Contemporâneo de outros colegas: Jesus Ollé Vives, Joaquim Pedro Gaffrée e Antônio Fayad.
Foi funcionário do antigo INAMPS, sempre muito dedicado à profissão, clinicando por quase quatro décadas.
Em 15 de dezembro de 1958, casa-se com Maria Miranda Barcellos, professora, produtora rural e musicista, com a qual teve os filhos: Eduardo, Brás e José.
Quando contraiu núpcias, conviveu por dois anos na residência dos sogros, na mansão dos Barcellos, de Bernardino Vaz Barcellos, apelidado “Seu Bulica” e sua esposa Helena Miranda Barcellos. Esta casa que foi, em tempos mais recentes, a Casa Krause e, hoje, ocupada pelo Grupo JW, esquina Marcílio Dias com Bento Gonçalves foi construída por Nepomuceno Saraiva em 1912. 
Dr. Brás teve atuação nos hospitais de Bagé e, em muitos outros lugares, dentre os quais, onde hoje é a lateral da Câmara de Vereadores, entrada pela rua Senador Salgado Filho, ao lado do Banco Itaú, no mesmo ambiente do advogado Otávio Santos, os quais se revezavam; bem como, no Edifício Trás-os-Montes e, também, no Amélia Kalil.
Tinha estilo discreto e calmo para lidar com os anseios da saúde humana.
Adorava futebol, tendo sido goleiro do Ginásio Auxiliadora, do Ferroviário e dos Liberais, este formado por médicos, odontólogos e advogados.
Era torcedor ferrenho do Guarany Futebol Clube, colaborando muito com o clube, do qual foi presidente.  
Foi médico das entidades Associação Atlética Banco do Brasil (AABB), Bagé Tênis Clube e Cantegril Clube de Bagé, onde se realizavam exames de praxe dos sócios que permitiam usufruírem dos banhos de piscina.
Pertencente a uma das mais tradicionais famílias bajeenses, chamava a atenção pelo jeito simples e despojado de atender seus pacientes, o chamado “espírito humanitário” e generosidade no atendimento dos pacientes; pois muitas vezes, além de prescrever a medicação, ainda alcançava o dinheiro àqueles menos favorecidos.
Igualou dita profissão a um verdadeiro sacerdócio! Por sua vez, a esposa acima referida, teve seus méritos, pois, durante vários anos acompanhou e se submeteu, a despertar no meio da noite, para proporcionar ao marido a tranquilidade dos plantões médicos e chamados de urgência, como aqueles provenientes do então serviço intitulado “SAMDU” - Serviço de Assistência Médica Domiciliar e de Urgência da Previdência Social, cujo motorista era “Roberto Gatto”.
O filho Brás Barcellos Machado, recorda que o atual Vice-presidente da República, um dia, há mais de 40 anos, lhe falou: “O teu pai, o ‘tio Brás’, é uma excelente pessoa e um médico que muito bem tratou da saúde de minha mãe” [chamada Wanda Coronel Martins Mourão]. O termo ‘tio’ seria devido ao fato da mãe do militar Antônio Hamilton Martins Mourão ser prima do médico em questão. Uma expressão muito peculiar do renomado médico era dizer: “Está tudo otimamente ótimo”!
Como político, pertenceu ao MDB e PFL, tendo concorrido a vereador pelas duas legendas.
Faleceu em 06 de fevereiro de 1994, aos 68 anos, deixando a esposa e filhos. 
O legislativo municipal outorgou uma rua (antiga via pública n° 482) em sua homenagem no bairro Maurício Infantini Filho (Morgado Rosa) através lei n° 3.314/96.
A partir de 1955, se fizéssemos uma revisão estatística ou científica do número de pessoas nascidas -bajeenses- pelas mãos do referido médico e um dos únicos atuando na área da ginecologia e obstetrícia, teríamos, nada menos, do que algumas dezenas de milhares de cidadãos nascidos do apoio deste profissional. Essa observação deve-se pela exclusividade e brilhantismo de sua competência profissional e esmero praticado em vida. Considerando que a grande maioria dos médicos hoje atuantes na cidade sequer eram nascidos.
Fontes:
Depoimento de Brás Barcellos Machado que agradece ao articulista acima e a Edgard Lopes Lucas pelo apoio, estima e colaboração.
Câmara de Vereadores de Bagé
Jornal Correio do Sul – ano 1990
Jornal Minuano, Coluna especial “Conheça sua cidade”, 20 de maio de 1999.



HIPÓLITO LUCENA


Hipólico Brissac Lucena nasceu em Bagé, em 03 de março de 1901. Filho de Joaquim Pereira de Lucena e Adelaide Brissac de Lucena. Estudou na cidade de Pelotas, formando-se pela Faculdade de Direito no dia 14 de dezembro de 1936.
Atuou no Fórum de Bagé mais de 25 anos. Casou-se no dia 23 de dezembro de 1934 com a professora Jenny Brissac Garcez, com quem teve o filho Hipólito Garcez de Lucena. Hipólito, além de advogado, era um exímio artista plástico, tendo pintado varias obras das quais se destacam: "Canto de Mesa" que mereceu menção honrosa apresentada no 1° Salão Bageense de Artes Plásticas, e "Lavanderia" que conquistou o prêmio Medalha de Bronze no 2° Salão Bageense de Artes Plásticas. Notabilizou-se também como poeta e escritor, publicando os seguintes livros: Festa no Inferno entre Vivos e Mortos (Verso – 1927); Saudades (Sonetos – 1932); Instantâneos (Verso – 1948); Ferro Velho - Poema sobre um Cão (1954); Tio Ventura - Poema Regional (1958) e Meus Pagos - Versos Regionais (1961).
Teve ainda inédito e não publicado quatro cadernos, sendo três de Poemas e Crônicas, e um de Fardos e Ditos Gaúchos.
Como poeta, compôs as letras dos hinos às cidades de Bagé e Pelotas e o do Clube Recreativo Brasileiro, da cidade de Bagé.
Faleceu em Bagé 03 janeiro de 1971, deixando um inestimável legado cultural para a Rainha da Fronteira Pelos seus relevantes serviços prestados à comunidade bageense, em 1973, seu nome foi imortalizado em uma rua no Bairro Getúlio Vargas, através de um projeto de lei de autoria do então vereador Iolando Machado.

Fontes:
Garcia, Elida Hernandes. "Escritores Bageenses", Bagé, Editora Praça da Matriz, 2006.232 p.
Jornal Minuano, Coluna especial “Conheça sua cidade” 1999.


O GAÚCHO E AS ESTRELAS


Desde o mais longínquo passado, os homens contemplam as estrelas. Representações de constelações foram encontradas em vários sítios pré-históricos espalhados pelo mundo.
De fato, não é surpreendente que os homens tenham-se fascinado pelos céus. Todos nós experimentamos esse entusiasmo de nos sentirmos parte do cosmos quando olhamos um céu estrelado. Os padrões aparentemente imutáveis desenhados pelas estrelas e a sua aparição regular no céu ao longo do ano, em contraste com os fenômenos sempre em mutação da Terra, constituíram tanto um refúgio, quanto uma referência para os seres humanos.
Os padrões atribuídos às estrelas mais brilhantes visíveis no céu são, claro, fruto da imaginação humana. Não somente o significado mitológico, mas até mesmo a maneira com que as linhas imaginárias são desenhadas entre as estrelas podem diferir de uma cultura para outra.
No Rio Grande do Sul, os gaúchos tem profunda afeição pelo Cruzeiro do Sul, que dá a sensação de que o estado recebeu uma faixa a meia-espalda, como uma premiação da natureza. Queridas dos gaúchos, em especial dos saudosos da querência, são as Três Marias, que sempre unidas, na disposição de um coração, irradiam suas luzes candentes, iluminando as estradas. Mas, indubitavelmente, a grande companheira do gaúcho é a Estrela D’Alva, conhecida carinhosamente pelo sulino como Estrela Boieira, guia inconteste dos boiadeiros.
Essa estrela surge no horizonte ao anoitecer, acompanhando os carreteiros que buscavam os chamados “pousos”. Nas longas jornadas; água na cacimba para os bois e cavalos de montaria, atar os bois no pasto, preparar um fogo de chão, um churrasco, uma cama de pelegos sobre os arreios. Os pingos espreitavam atados nas chavelhas das carretas, sobre o lume da estrela boieira. Era a fiel companheira na lida com os bois. O carreteiro dormia e a estrela boieira recolhia-se ao seu infinito. Na madrugada, sob a cantiga dos galos, ao longe, na retomada das lidas do carreteiro ou tropeiro, surgia no horizonte a assídua companheira. No nascente, como a preludiar o nascimento do sol. Sempre alva, como o pensamento de cuidado das mães ausentes.
A Estrela Boeira (na verdade, Planeta Vênus) foi e é tão importância histórica e culturalmente para os rio-grandenses, que se transformou num dos símbolos do tradicionalismo gaúcho e foi eternizada através da música de mesmo nome, através dos versos do cantor e compositor gaúcho Telmo de Lima Freitas:
“Estrela boieira, sinuelo da noite/Que mostra ao tropeiro o rumo a seguir/A noite se prancha nas barras do dia/E a estrela boieira começa a sumir. Se muda pra outra invernada do fundo/Sem deixar o rastro pra onde se foi/O dia já claro, o tropeiro canta/Ao som do mugido da tropa de boi. Os bichos do campo festejam o dia/Quebrando o silêncio do amanhecer/O tropeiro canta sua toada tropeira/Lembrando a boieira do seu bem-querer”.
O tempo passou e os novos meios de transporte acabaram sepultando as carreteadas e tropeadas. Porém, a admiração do gaúcho pelas estrelas permaneceu inabalável, que elas até hoje lhes servem de referência.

 Fontes:
Lamberty, Salvador Fernando. “ABC do Tradicionalismo Gaúcho”, Martins Livreiro, 1989.146 p.







A ROUPA E A CAMA DO PEÃO DE ESTÂNCIA DE OUTRORA


Antigamente, os peões campeiros passavam o dia inteiro de botas e, somente ao pôr do sol, ao chegar das lides do campo, é que as tiravam e calçavam um par de alpargatas. Lavavam as mãos e o rosto em pequena bacia de ferro ou alouçada, colocada em cima de um cepo; ao lado havia a toalha para enxugarem-se. Isso feito chegavam-se para a beira do fogo, no galpão, para tomar chimarrão. Se estivesse muito quente o dia, ficavam do lado de fora do galpão, sentados em pequenos bancos ao luar ou clarão das estrelas, tomando mate até ouvirem o sinal chamando-os para a janta. Depois de comerem, ainda retornavam pra mais um mate.
O peão de tropa passava o dia todo de botas calçadas; somente as tirava à noite para dormir. E isso o fazia à beira da cama de arreios. Ao acordar, a primeira coisa que fazia era tornar a calçá-las. Não usava aliviar os pés com o com uso de alpargatas, mesmo que durassem vários dias a tropeada, durante a qual nem pensava em lavar os pés, principalmente se fosse inverno.
Havia o peão que trabalhava a pé, fazendo de alpargatas ou mesmo descalço, serviços como de capina na lavoura, de quebra de milho, de aramado e outros. Estes largavam o serviço ao entrar do sol e vinham para o galpão. Costumavam de chegada lavar os pés, sentados em um banco baixo, junto a um cocho de pedra que tinha um pouco d'água. Com auxilio de um sabugo de milho ou de caco de telha de barro, mesmo sem sabão, esfregavam os pés, especialmente os calcanhares. Sem enxugá-los calçavam as alpargatas. Lavavam a seguir mão e rosto e reuniam-se aos companheiros na roda do mate amargo. Juntos todos, sem distinção, cada um contava seus feitos, dificuldades ou gauchadas na faina do dia.
Entre 10 e 11 horas tratavam de arrumar a cama para dormir, no verão ao relento, tendo como teto as estrelas. Madrugada grande, aí pelas quatro horas e meia, já estavam de pé, tomando chimarrão. Dormiam com a roupa do corpo, tendo o chapéu a cobrir-lhes o rosto. A cama, a que davam o nome de "tarimba'', duas tábuas unidas por dois listões, era colocada no chão.
Alguns tinham cama tipo de vento, com pés altos e cruzados em forma de um X. Chamada de “catre”, tinha o leito feito com tábuas tiradas de uma velha barrica; havia catre inteiramente forrado de couro cru. Sobre a tarimba ou sobre o catre, estendiam os arreios, tendo como colchão a carona e os pelegos; o serigote servia de travesseiro. Usavam como coberta o pala ou nada, se fosse noite de verão. No inverno, tapavam-se com o poncho ou com a capa.
Os peões passavam a semana inteira com a mesma roupa do corpo, que era mudada aos sábados de tarde, se conseguiam dispensa do serviço ou aos domingos.
No geral, os gaúchos tinham só três mudas de roupa: uma no corpo, outra na lavadeira e uma terceira de reserva. Esta última a guardavam em um baú, ou caixão ou pendurada em rústico cabide de madeira ou em pregos cravados na parede. Junto com essa muda de reserva estava o lenço de pescoço, o chapéu, um par de botas, uma guaiaca e, às vezes, um casaco. Era para passeios, bailes, dias de festa e de carreira.
A bombacha era de uso geral. Não usavam calça alguma, nem para dias festivos ou para ir à cidade. Os mais pobres só tinham duas mudas e para mudar de roupa no fim de semana precisavam ir à casa da lavadeira pegar a roupa lavada. Logo depois iam à sanga tomar um banho e vestir a roupa limpa. Pegando a suja, voltavam à casa da lavadeira onde a deixavam para lavar. Nos próximos domingos repetiriam a manobra.
A lavadeira, além de lavar e passar a ferro, tinha o cuidado de pregar algum botão e de remendar o que fosse necessário. Havia gaúcho tão mal de roupa que, por economia, ou falta de sabão e para não pagar lavadeira, ele próprio aos domingos ia lavar e pescar no arroio. Nessa ocasião, aproveitava para lavar sua única muda de roupa, secando-a ao sol enquanto tirava algum peixe. À tardinha apresentava-se na fazenda vestindo a mesma roupa, porém limpinha.
O peão antigo não gostava das comodidades do homem da cidade que muda de roupa para dormir, tem cama de colchão macio e troca seguido de camisa e roupa de baixo. A falta dessas comodidades não lhe fazia "bater a passarinha", isto é, não lhe incomodava e nem causava inveja. O gaúcho do passado embora toda a falta de conforto, sempre se mostrava no serviço de cara alegre e de boa disposição.

Fonte:
Gonçalves, Raul Annes. "Mala de Poncho – Reminiscências e Costumes Campeiros", Porto Alegre, Martins Livreiro, 1987.89 p.

DELFINO PACHECO FILHO



Nasceu em 29 de maio de 1902, no Piraí, interior do município de Bagé. Filho de Delfino Antônio Pacheco e de Maria José Barboza.
Ainda criança, na localidade de Piraí, quando já frequentava a escola, seu pai, costumava cobrar as lições para verificar se os estudos estavam em dia. Uma vez, não soube responder os questionamentos do pai, resolveu, então, conversar com seu primo, Felomeno, para que ele o auxiliasse nos afazeres da escola para não ficar para trás; depois disso pode provar para seu pai que mantinha seus estudos em dia, além de sempre escrever com uma belíssima caligrafia.
Desde cedo, Delfino Filho mostrou-se dedicado e descobriu uma forma de tocar os instrumentos que não podia comprar: oferecia, para seus amigos, o conserto das gaitas que estavam estragadas e depois disso aproveitava para aprender a tocá-las. Era despachado e consertava vários objetos e, assim, ia descobrindo novas funções. E não parava por aí: arrumava relógios, cortava cabelo, era carpinteiro e pedreiro.
Sua carteira de trabalho comprova que foi joalheiro, industriário, agricultor. Tudo o que fazia era com muito capricho e reconhecido pelas pessoas que com ele conviviam.
Posteriormente, contraiu matrimônio em 1928 com Laurinda Leite Pacheco, com a qual teve os filhos: Dina, Zenaide, Delci, Delmar, José, Maria, Delfino, Dilmo, Loiva, Adel, Nilta e Douglas.
Certa feita, acampou no mato com seu filho Delci, a fim de cortar palha santa fé para fazer a cobertura da escola do Piraí. Nesse momento, pediu para o filho ir até a casa de seu amigo Dorvalino que residia próximo à Estância do Sobrado Velho, para buscar uma arma, afim de capturar alguma caça que viesse surgir, para servir de alimento. Dessa forma, ia ensinando seus filhos a realizar os afazeres que anteriormente aprendeu sozinho. Muitos dos seus ensinamentos estão presentes até hoje na família Pacheco.
Trabalhou nas épocas de safra, na Cooperativa Bajeense de Carnes (Charqueada São Domingos), no período de 1º de abril de 1942 a 09 de junho de 1962. Já no período contrário a safra, se deslocava para a região do Piraí, para trabalhar na Estância do Portão, na época, propriedade de Gideão Rato. Nessa fazenda, construiu um monumental conjunto de cercas e mangueiras de pedra, que são utilizadas até hoje.
Por volta de 1963, mudou-se para uma casa alugada localizada na vila de São Domingos, passando a fazer história no bairro, auxiliando na organização e urbanização do local, tendo boa relação com todos os moradores. Também cultivava hortas, onde compartilhava ensinamentos da terra e plantação com seus filhos e demais interessados.
Mais tarde, construiu sua casa própria no bairro, com ajuda dos filhos Delci, Delfino e Delmar. Após a sua aposentadoria, seguiu trabalhando com construção de pedras, sua especialidade, fazendo muros de porteiras, galpões, casas rurais e urbanas.
Delfino foi um homem honrado e muito batalhador, trabalhando em diversos ofícios e passando por diversas dificuldades, como por exemplo: percorrendo quilômetros de campos cobertos por geadas de madrugada, para cumprir seu horário de trabalho, e assim proporcionar uma qualidade de vida melhor a sua família. Ele e sua esposa, dona Santa (como gostava de ser chamada), ensinaram e compartilharam tudo que aprenderam em sua longa jornada, servindo de exemplo.
O casal costumava sentar na varanda da casa ou embaixo das árvores de paraíso, para tomar um chimarrão. Delfino adorava compartilhar com seus netos as famosas balas de banana ou, no horário do almoço, o vinho açucarado – não só com açúcar, mas também com amor. Nos fins de tarde, reunia os netos na calçada da sua casa para contar histórias por ele passadas. Além disso, Delfino gostava de colher goiabas direto do pé nos fundos de sua casa e dividir com seus netos nas tardes quentes de verão.
Faleceu em 10 de outubro de 1994, deixando além da esposa e filhos, os netos: Claudete, Cleonice, Rangel, Edgar, Clóvis, Milton, Elaine, Zolaine, Tatiane, José Ênio, Laura, Rita, Deicilene, Delci, Andreia, André, Ana Eliza, Cleide, Cátia, Cintia, Mara, Roberto, Jandrei, Michel, Rafael, Raquel, Roberta, Emerson, Juliano, Simone, Adriano, Luciana, Roger, Anderson, Laura, Douglas. E também os bisnetos: Priscila, Diego, Juliana, Jéssica, Leonardo, Fernanda, Francine, Douglas, Henrique, Lucas, Emilene, Camila, Max e Roberta.


LEONARDO DE BAGÉ



Jader Moreci Teixeira nasceu no dia 30 de novembro de 1938, na Vila de Santa Tereza, em Bagé. Filho de Lídia Teixeira e pai desconhecido.
Na Rainha da Fronteira, cursou o primário na Escola XV de Novembro.
Pela impossibilidade da família de criá-lo, viveu em lar adotivo do qual não trazia boas recordações. Mesmo com a vida difícil, obrigado a trabalhar exaustivamente na lavoura e em lides campeiras, gostava muito de música e chegou a vencer um concurso de calouros infantis na Rádio Cultura, interpretando a música “O ébrio” (canção consagrada por Vicente Celestino).
Em 1949, se desentende com o padrasto e foge do lar adotivo, empregando-se em algumas estâncias próximas à Vila de Santa Tereza, onde passa a adolescência trabalhando com o gado e plantações. Certa feita, quando estava no centro da cidade, teve a oportunidade de presenciar da janela da Rádio Cultura a apresentação do cantor Pedro Raymundo.
Sempre gostou de leitura, e um fato decisivo em sua vida foi que em uma das fazendas em que trabalhou, havia uma bem sortida biblioteca. A patroa fazia gosto que o menino tivesse acesso aos livros, chegando a dispensá-lo em determinados horários de trabalho para que pudesse ler. Assim pode conhecer poesia, contos, novelas e (sua predileção) a história.
Em 1957 parte para Porto Alegre em busca da mãe, que só muito mais tarde, acabaria encontrando-a e podendo abrigá-la. Na capital, passa a viver de serviços braçais. Dormia e comia onde pudesse, chegando a dormir em bancos de praça.
Um dia, passando em frente a um circo, vê uma placa: “Precisa-se de um palhaço”. Não perde a oportunidade. Nesse circo começa a viver momentos felizes como o “Palhaço Sabugo”. A parte musical do circo ficava por conta de uma dupla sertaneja, e o jovem Jader aprende a cantar e tocar com os novos amigos. Logo estaria compondo suas próprias canções do gênero.
Em 1959, forma dupla própria com Leopoldo Lino dos Santos, ocasião que adota o pseudônimo “Leonardo”. Com a dupla “Leopoldo e Leonardo”, consegue gravar três discos em São Paulo, voltados para o mercado nacional, mais receptivo à música sertaneja do que o Rio Grande do Sul.
Em 1962 forma nova dupla com Deroí Marques: “Leonardo e Leonir”. Apesar de considerar sua melhor dupla, nunca chegaram a gravar devido às dificuldades, que começavam a surgir no mercado fonográfico. Era o início dos anos 60, um período de grandes transformações na cultura brasileira e no mundo.  
Em 1964, de volta ao Rio Grande, percebe a grande força da música regional gaúcha que se estruturava e que buscava mercado próprio. Com os irmãos Elmo e Bruno Neher integra o grupo “Os Três Xirus”. Atinge sucesso nacional com a música “Baile da Coceira”.
Em 1965, o conjunto “Os Três Xirus” é indicado para representar o Brasil na Feira Internacional de Santarém, em Portugal. A música “Baile da Coceira” repercute intensamente naquele país, tornando-se o principal sucesso do carnaval de Lisboa.
Em 1971, com o grupo “Os Três Xirus”, faz o show de abertura da I Califórnia da Canção de Uruguaiana, sendo, portanto, o primeiro músico a cantar no palco principal.
Em 1975, depois de vários anos de sucesso, com dez discos gravados, sendo três em alemão para a colônia gaúcha, deixa “Os Três Xirus”, passando a integrar o conjunto “Os Vacarianos”. No final desse ano, resolve retomar a carreia solo.
Em 1976, vai a São Paulo em busca de contatos com duplas sertanejas; consegue algumas gravações, mas, sem a repercussão pretendida. Três meses depois, retorna para o Rio Grande do Sul e passa a produzir o selo fonográfico “Querência”, pelo qual trabalhou e lançou mais de 200 títulos e autores, entre os quais: “Gaúcho da Fronteira”, “Os Mirins” e “Os Atuais”.
Em 1978, compõe “Céu, Sol, Sul, Terra e Cor” e vence a III Ciranda Teuto Rio-Grandense de Taquara, acompanhando pelo conjunto “Os Mirins”.
Em 1979, começa a série de gravações individuais com o disco “Leonardo”, pela K-Tell.
Em 1980, é um dos vencedores da I Guarita da Canção de Torres, com “Batismo do Sul”. No ano de 1981 lança o LP “O Fumo”.
Em 1982, vence a Califórnia da Canção de Uruguaiana, com “Tertúlia”, acompanhado pelo conjunto “Os Serranos”. Lança o LP “Bagual de Chácara”, pela Discos Chororó.
Prossegue em intensa série de show e lança o LP “Viva a Bombacha”, pela Chanteler.
Em 1984 sai pela Gravações Elétricas, o LP “Morocha Não”, cuja canção título era uma resposta à humorística “Morocha”, surgida em festivais.
Em 1986 vence a Ciranda das Cirandas, festival que fazia um balanço de dez anos, onde concorriam as vencedoras de cada ano. Leonardo havia vencido com “Céu, Sol, Sul, Terra e Cor”, em 1978. Lança o LP “Carta à Uruguaiana”, pela Chanteler.
Em 1987, recebe o título de “Compositor do Ano”, do Sindicato dos Compositores. Sai pela ACIT, o disco comemorativo “Leonardo – 25 Anos”.
Em 1989 lança o LP “Passo Fundo, Tchê”, pela ACIT. Um ano após, lança o disco “21 Grande Sucessos”, pela ACIT.
Em 1991 Lança o disco “Aos desgarrados”, pela ACIT.
Dois anos após, lança o disco “O analista bem perto de Bagé”, mais uma vez pela ACIT. Em 1994 lança o disco “Vivências” pela ACIT. Três anos após, vence o Festival Ronco dos Roncos, em São Francisco de Paula.
Em 1997 Lança o CD “Exageros de Gaúchos”, pela USA Discos.
Em 1998, de volta à ACIT, lança “O Homem do Pala Branco”. Um ano após, recebe o troféu “Guri”, da RBS, como destaque do ano. Lança o CD “As Mais Premiadas”, pela ACIT.
Em 2000 a canção “Céu, Sol, Sul, Terra e Cor” é escolhida em enquete popular realizada pelo jornal Zero Hora como a “Música Símbolo do Rio Grande do Sul”, entre as principais músicas do século XX. Retornando à USA Discos, lança o CD “Dança do Maribondo”.
Em 2001 lança o CD “Só Sucessos”, pela USA Discos. Dois anos após, lança o CD “Os 16 Grandes Sucessos”, pela ACIT.
Em 2004 lança o CD “Pátria Azul”, pela Agevê Music.
Em 2008 lança o CD “Só Sucessos - Acústico”, pela USA Discos.
Dois anos após, lança o CD “35 Mega Sucessos”, pela Mega Tchê.
É, seguramente, um dos maiores compositores da história do Rio Grande do Sul e, ao lado de Teixeirinha e Elton Saldanha, um dos autores mais gravados por terceiros.
Foi casado em primeiras núpcias com Sueli e, pela segunda vez, com Margarete Mählmann Teixeira, do qual teve o filho Jader Moreci Teixeira Filho.
Desde abril de 2003, apresentava aos domingos um programa de música nativista na Rádio Guaíba, chamado "Província de São Pedro".
Faleceu no dia 7 de março de 2010, em Viamão, deixando o filho e três netas.
Fontes:
Revista CEEE/Som do Sul, Fascículo nº 7, Porto Alegre, Editora Alcance, 2002, 18 p.

TINO MADEIRA



Justino Madeira, conhecido popularmente como “Tino Madeira, nasceu em 18 de abril de 1901, em Rio Negro, atual Hulha Negra. Filho de Manoel Madeira e Ignácia Madeira, numa família de nove irmãos. Foi casado com Leontina Dourado, com quem teve a filha Cecy.
Homem simples, das lides do campo, não chegou a ser alfabetizado, tendo aprendido apenas a assinar seu nome, mas, tinha uma característica ímpar: sabia fazer contas com extrema agilidade, já demonstrando o grande tino comercial. 
Começou suas atividades no comércio comprando gado e abatendo para comercializar no açougue de sua propriedade em Hulha Negra. Tempos depois, construiu as instalações de um matadouro, podendo, então, aumentar a produção.
Mais tarde, começou a comprar eucaliptos e, após o corte, comercializava a lenha em Bagé, para a antiga CICADE. Outro empreendimento seu foi a extração de carvão mineral em Hulha Negra, tanto em terras de sua propriedade, como arrendadas.
O transporte desse carvão se dava por via-férrea, com o carregamento próximo as carvoeiras, no local denominado Desvio São Geraldo.
Desde essa época, sempre estimulou seus dois netos Ana Luiza e Justino Henrique a estudarem e a acompanharem o seu trabalho; muito cedo eles o acompanhavam na medição de lenha, ou então aprendendo a fazer o caixa no estabelecimento comercial.
Com esse espírito empreendedor, iniciou a plantação de eucaliptos em sua propriedade, também explorados após o corte.
Algum tempo depois, começa a investir na formação de um grande pomar, com uma diversidade muito grande de frutas, principalmente cítricos, assistido pelo Eng.º Agrônomo Nicanor Antônio Rish, seu amigo de longa data. Esse pomar contava com 1.360 pés de frutíferas, consorciado com extensa plantação de morangos. Parte da produção dele era comercializada em Hulha Negra, outra parte presenteada a amigos, gesto que talvez fosse o seu maior prazer. Esse fato ainda é lembrado até hoje por muitas pessoas, que já conheciam quando ele passava no seu jipe: acionava a buzina e logo ia descendo com cestas ou sacos cheios de frutas.
Desde o início de suas atividades, contou com a ajuda de sua esposa e filha, esta última atuando na parte da contabilidade. Contava com três empregados fixos, na quinta, no matadouro e no açougue e uma quantidade maior, variável no corte de lenha e extração de carvão, tendo, em algumas épocas de safra, mais ou menos trinta e seis funcionários.
Homem desprendido, com caráter firme, sempre disposto a ajudar quem precisasse, sua memória é lembrada até hoje, tanto pelos que conviveram com ele, como pelos que ouviram contar a sua história. 
Faleceu a 31 de Janeiro de 1984, deixando esposa, filha, netos e os bisnetos: Rodrigo, Fernanda e Ricardo.

ATTILA SIQUEIRA



Attila Jesus Sá Siqueira nasceu em Bagé, em 1922. Filho de Célia Sá Siqueira e do engenheiro-civil Antônio Siqueira que, por longos anos, prestou inestimáveis serviços à Prefeitura Municipal de Bagé. Ele e seus irmãos foram criados e estudaram em Porto Alegre, mantendo sempre contato com a terra natal.
Attila formou-se em 1946, na Escola de Agronomia e Veterinária de Porto Alegre, transformada depois em Universidade Federal do Rio Grande do Sul, ingressando no ano seguinte na Secretaria da Agricultura do Estado, no Serviço de Ovinotecnia.
Depois de rápido estágio na capital, veio para Bagé, para trabalhar na Associação Riograndense de Criadores de Ovinos (Arco) em convênio que durou seis anos e meio, atendendo o setor de seleção de ovinos.
A seguir, seus serviços foram requisitados por Floriano Bittemcourt, proprietário da Cabanha A Tala, onde por dezesseis anos desempenhou as funções de diretor-técnico, além de ter sido responsável pela organização total do estabelecimento localizado em Dom Pedrito e que se dedicava a criação de gado Hereford e ovinos Romney-Marsh e Corriedale.
Deixando a iniciativa privada, foi convidado a ingressar no Conselho de Desenvolvimento da Pecuária de Corte (Condepe), um órgão de projetos agropecuários criado em 1968, pelo governo Federal, financiado pelo Banco Internacional de Desenvolvimento (Bird).
Com a extinção do órgão, em 1976, os técnicos, em sua maioria, foram designados para a Associação Sulina de Crédito e Assistência Rural (Ascar), depois Emater.
Além destas atividades, foi pecuarista, tendo arrendado um campo com um amigo. Foi ainda cabanheiro, por seis anos, de Pardo Santayana.
Profissional de renome, Attila Sá Siqueira era constantemente convidado para servir de jurado em exposições, não só no Estado, como também no exterior.
Ele foi jurado em Bagé, Esteio e em Montevidéu, entre outras. Era especializado nas raças Polled-Hereford, Romney-Marsh e Corriedale.
Muitas foram as entidades e instituições que contaram com os serviços do competente e conceituado técnico, como a Associação de Engenheiros-Agrônomos de Bagé, da qual foi presidente, Associação Rural de Bagé, Associação Brasileira de Criadores de Ovinos, (Arco), Associação Brasileira de Criadores de Hereford e Polled-Hereford. Foi professor da Faculdade de Agronomia e Veterinária, da Universidade da Região da Campanha (Urcamp).
Intensas também foram suas atividades culturais, como membro do Cultura Sul, conselheiro da Diretoria de Cultura, da Secretaria Municipal de Educação e Cultura, e do Núcleo de Pesquisas Histórias Tarcisio Taborda.
A preservação do meio-ambiente foi sempre uma grande preocupação de Attila Siqueira, em especial a poluição de Candiota.
Ele foi um dos primeiros a se manifestar contra o que chamava de “degradação ambiental” naquela localidade.
Para ele seria muito mais saudável importar petróleo para a produção de energia do que a exploração de carvão de Candiota, considerado de baixa qualidade.
Costumava também alertar para a poluição causada pelos defensivos agrícolas e o carrapaticida usado no banho do gado.
Além de competente e conceituado profissional, Attila se destacou como desenhista de indiscutíveis méritos, especialmente retratando temas gaúchos, que conhecia como poucos. Desde muito cedo, ainda criança, ele começou a desenhar. Nunca pensou, no entanto, se dedicar inteiramente a esta arte.
Dizia-se autodidata, não tendo frequentado, como poderia, uma escola em Porto Alegre, sua preocupação maior era a profissão, pois o desenho para ele era apenas um lazer, tanto que vendeu apenas poucos trabalhos.
Seus desenhos, que elaborava com incrível rapidez, eram muito procurados e estão, inclusive no exterior, em casas de amigos ou de pessoas que gostam de temas gaúchos ou até mesmo em paredes, como no Centro Administrativo de Bagé. Suas ilustrações também foram estampas de livros e capas de CDs de festivais nativistas, entre outros, feitos com lápis de cera, material que deixou de usar, utilizando-se ultimamente do pincel atômico. Trabalhou também com nanquim e lápis e caneta néon-pen.
As cenas gaúchas eram sua preferência nos desenhos, o uso, o costume, a vestimenta do homem do campo e ele dizia que seu gosto pelas coisas do Rio Grande do Sul surgiu porque sempre teve contato com o campo na estância de seus avós maternos, onde passava as férias.
Manifestava sempre sua satisfação e alegria por ter uma filha que desenhava muito bem, assim como por seus seis netos também desenharem.
Estudioso, profundo conhecedor da história do Rio Grande do Sul, tradicionalista admirado em todo o Estado, Attila Sá Siqueira era constantemente convidado para proferir palestras, o que fazia com o maior brilhantismo.
Era um intransigente defensor dos verdadeiros hábitos e costumes do homem do campo.
Sua presença em eventos nativistas era sempre uma atração à parte, pois todos queriam usufruir de seus conhecimentos.
Ele recordava que “o embrião do Centro de Tradições Gaúchas 35” de Porto Alegre, o primeiro do Estado, foi no pátio da residência de seus pais. Estudantes, principalmente da fronteira, costumavam se reunir, para churrasco com violão, na casa de um dos integrantes, foi quando surgiu Paixão Cortes que se integrou ao grupo e à ideia da fundação do CTG.
Attila Sá Siqueira faleceu de parada cardíaca, aos 85 anos de idade, em 11 de maio de 2007, no Instituto do Coração, em Porto Alegre, onde fora para realizar exames médicos.
Era casado com Beatriz Siqueira e deixou os filhos Fany Beatriz, Maria Cristina e Ricardo. Foi sepultado no cemitério da Santa Casa de Bagé.
Na época, o então prefeito municipal, Luiz Fernando Mainardi decretou luto oficial por três dias, considerando sua contribuição para o desenvolvimento do município, “além de ter perpetuado em seus desenhos a história do homem do campo”. Também, a Associação dos Amigos do Parque do Gaúcho, do qual Atila era sócio fundador, reverenciou a sua memória.

Fonte:
Lopes, Mario. “Personalidades de um século em Bagé”. Bagé, NPHTT, 2012, 248p.

OS MASCATES



“Mascate” foi o nome dado no Brasil aos mercadores ambulantes e vendedores de "porta em porta", também chamados de “turcos da prestação” ou simplesmente “turcos”. A origem do termo "mascate" vem do árabe El-Matrac, vocábulo usado para designar os portugueses que, auxiliados pelos libaneses cristãos, tomaram a cidade de Mascate (no atual Omã) em 1507, levando mercadorias.
Embora o termo não seja utilizado em Portugal com o mesmo significado, o nome "mascate" ficou sempre associado à imigração árabe no Brasil, resultante do grande contingente de imigrantes provenientes do Líbano e da Síria que se dedicaram a esta atividade. Em menor número, chegaram também ao Brasil, imigrantes de outros pontos do antigo Império Otomano, como Turquia, Palestina, Egito, Jordânia e Iraque. Como tinham sotaque eram nomeados de “turcos da prestação” ou apenas “turcos”, pois naquela época o Império Turco-Otomano controlava boa parte do Oriente Médio; como os imigrantes destes países vinham com a nacionalidade turca em seus documentos, ficaram conhecidos popularmente por este nome.
Os mascates eram figuras constantes no meio rural no Rio Grande do Sul, principalmente na Região da Campanha, onde comercializavam diversas mercadorias de uso pessoal.
Quando estas figuras apareciam na zona rural, eram sempre bem recebidas nos sítios, chácaras e estâncias. As pessoas mostravam-se curiosas para dar fé e comprar alguma coisa entre as bugigangas que traziam.
Para desempenhar a sua atividade deslocavam-se em carroças, a cavalo e, às vezes, com um cargueiro a cabresto carregando grandes malas. Nelas vinha uma infinidade de coisas: cortes de fazenda para vestidos ou bombachas, lenços, carpins, meias, corpinhos, ceroulas, cintos, linhas, agulhas, sabonetes, pentes, relógios despertadores, brincos, pregadores, perfumes, ligas, calças para mulheres...
A mercadoria no geral era de boa qualidade, porém com referência às bijuterias, perfumes e relógios de pulso, a maioria era de pouco valor, imitação, alguns, pura fantasia. Mas, estas miudezas eram o que mais atraíam a atenção das mulheres e “moças casadouras”.
O turco, com certa dificuldade de pronunciar nossa língua, elogiava sua mercadoria e o baixo preço com que era vendida. O pessoal, no geral, comprava. Alguns até faziam encomenda de artigos que o mascate não tinha na ocasião. Nisso, o “turco” era cumpridor; passados uns dois meses, ele aparecia com as encomendas solicitadas e um novo e variado sortido de mercadorias, adquirida nos comércios da cidade, a fim de satisfazer sua freguesia rural, que criou com ele vínculos de amizade e respeito muito fortes, pela sua rigidez em cumprir aquilo que tratava.
Os mascates desapareceram a partir do momento em que o automóvel foi ficando acessível a muitas pessoas e as estradas, por conseguinte, em melhores condições permitindo o deslocamento, mais rápido, até os comércios da cidade.
A maioria dos mascates ou “turcos” de Bagé, transformaram-se nos proprietários das maiores lojas da cidade.

Fontes:
MATTOS, Eron Vaz. "Aqui – Memorial em Olhos D’água", Bagé, Gráfica CECOM, 2003. 210p.
Gonçalves, Raul Annes. “Mala de Poncho – Reminiscências e Costumes Campeiros”, Porto Alegre, Martins Livreiro, 1987.89 p.