sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

CARTA PARA MEU PAI

Pai quando naquele dia me colocaste no carro, fiquei alegre e faceiro, pois achei que nós iríamos fazer um passeio juntos. Agora que faz uma semana que estou aqui nessa estrada, sinceramente não sei por que me deixaste aqui! Se foi por causa daquela vez que ao te encontrar pulei e sujei tua roupa, ou talvez outra ocasião que arranquei algumas penas de uma galinha do vizinho, ou quem sabe foi aquele dia que corri atrás de um motoqueiro que passava pela rua. Olha pai, me perdoa se não agi conforme o teu agrado, mas quero que saibas que se fiz alguma coisa errada, não foi por mal. Pai, sinto muito a tua falta, do teu jeito, do teu cheiro... Ainda me lembro das nossas brincadeiras com a bola e quando jogavas longe um pedaço de madeira para eu buscar... ai, ai... quantas recordações, até parece que foi ontem, que quando chegaste de teu trabalho percebi teu semblante de tristeza e me deitei aos teus pés, tu baixaste lentamente tua cabeça, e senti tuas lágrimas pingarem em cima de meu pelo. Aquelas gotas salgadas foram uma gloria para mim, pois logo se transformaram num lindo sorriso teu seguido de um prolongado carinho, que até hoje não me sai da memória. Pai, por aqui somente vejo ao meu redor campo e mais campo e de vez quando algum carro, carroça ou bicicleta que passa pela estrada. Faz vários dias que não me alimento, a última refeição que fiz, foi uma carniça de um bicho que achei no meio do campo. Pai alguns dias atrás, um homem jogou na estrada um pedaço de carne fresquinha, corri o mais ligeiro que pude para tentar pega-la, mas infelizmente, outro cachorro conseguiu chegar primeiro que eu e a engoliu inteira. Pai por aqui as horas durante o dia parecem ser muito mais longas e as noites intermináveis, pois quase não consigo dormir por causa dos diversos sons assustadores que por aqui pairam. Essa noite não consegui pregar o olho, pois o cachorro que comeu aquele pedaço de carne que eu tanto desejava, passou a madrugada inteirinha gritando desesperadamente de dor. Ao amanhecer o encontrei morto com os olhos esbugalhados, a boca ensangüentada e suas fezes cheias de cacos de vidros. Pobre animal, morreu agonizando. Com certeza foi papai do céu que me livrou dessa, pois foi por um triz que não peguei aquela carne! Pai estou magro, minhas costelas estão aparecendo, meus olhos estão pequenos e fundos. Estou muito fraco, minha forças estão chegando ao fim, mas mesmo assim, ainda sonho que um dia venhas me buscar e não me importo de dormir ao relento, frio e chuva, desde que seja bem pertinho de ti. Pai, não sei até quando vou agüentar, mas independente do que aconteça daqui para frente, quero que saibas que tu eras tudo para mim e que embora esteja longe de ti não deixei de te amar um só segundo .

Com carinho,

Do Seu Querido Cãozinho Amigo.


Publicado na Coluna Livre do Jornal a Primeira Folha, Página 03, de 25 a 27/09/2010

Nenhum comentário:

Postar um comentário